terça-feira, fevereiro 21, 2017

Boteco das Tertúlias .... #16





Cá estou eu sogadito no meu canto, sempre no mesmo sítio, junto ao Eucalipto José e a Pedra Maria, o Lago Jeremias em frente, e lá ao fundo a janela da D. Cidália. Que vida rotineira, a minha e a dela. Eu não vejo outras bandas porque estou preso ao chão, porque o meu trabalho é servir de assento, mas aquela pobre alma, a D. Cidália, bem que podia escolher outra vida. Ou talvez não. Diz que sempre foi feliz nestas paragens. E quando se é feliz, para quê mudar? Para quê mexer no que já está perfeito? 

Já lhe servi de assento várias vezes. Ainda me lembro quando a D. Cidália e o Sr. Manuel eram dois jovens pombinhos, há muitos muitos anos. Que coisa bonita! Promessas de amor e fidelidade... Parece que ainda os estou a ouvir:

“És a mulher da minha vida, Cidália! Já viste que estamos casados faz hoje 1 mês, 2 semanas, 3 dias, 1 hora e 25 minutos. Vamos amar-nos para toda a vida, não vamos? 
e respondeu ela:
Que me dizes a gravarmos os nossos nomes neste banco de jardim e eternizar esta paixão? Quando formos velhinhos, voltamos cá com os nossos filhos e netos e relembraremos este momento com o mesmo amor.

Nessa mesma tarde, a D. Cidália fez bolo de cenoura para cevar o seu Manel. Estava bom, tenho a certeza, cheirava a manteiga batida com açúcar e ovo. Ele foi colher azedas e papoilas para lhe colorir a cozinha. Ela chamou-o "vem para dentro que está a arrefecer e vem aí geada!", deu-lhe a provar a massa do bolo, ainda por cozer, com a ponta do dedo, fechou a janela e entregou-se ao amor.

Essa noite deu frutos. Frutos que hoje brincam à volta aqui do Banco Francisco, que se empoleiram no Eucalipto José e fazem amonas uns aos outros no Lago Jeremias durante as férias de verão.

A D. Cidália é feliz aqui bem. E no fundo, no fundo eu também.







Este texto faz parte da colaboração da Limonada da Vida com o projecto Boteco das Tertúlias.
Um debate de ideias mensal na companhia 
das estimadas Lifes Textures e Contador d'estorias)


2 comentários:

Diz o que te vai na alma