segunda-feira, junho 23, 2014

Por que gosto de viajar:


Muito para além do sair da rotina, bronzear o corpinho em praias paradisíacas, conhecer sorrisos e fisionomias de povos distantes, descobrir obrigados em diversas línguas, deliciar-me com diferentes gastronomias, em resumo, muito para além de tudo aquilo que já é da praxe, o que me dá mesmo ganas de viajar é o sair da minha zona de conforto e encarar os meus próprios limites.

A minha última aventura foi pela Tailândia. Pouco conhecia daquele país, a não ser as fotos de praias fantásticas com mar verde esmeralda, areia branca e rochedos inusitados. Sabia que algumas partes da Tailândia tinham sido devastadas pelo tsunami de 2004, e que o clima tropical se proporciona a tempestades e monções (apesar do calor imenso). Já tinha ouvido uns ruídos sobre uns shows de ping pong, e ... pouco mais.

O que eu não sabia é que as ruas de Bangkok me animariam pela movimentação de 6 milhões de pessoas, que eu própria iria contribuir para o barulho ensurdecedor de motas e tuk tuks, que me iria fazer sorrir o rosa fushia dos taxis, e que me recusaria a provar as iguarias cozinhadas nos passeios repletos de tachos e wooks de cheiro fecundo e enjoativo. Não me tenho como uma pessoa esquisita, gosto de experimentar sabores e texturas diferentes, mas qualquer roulote em dia de bola é restaurante 5 estrelas comparado com cozinheiros que ora mexem no pés descalços ora na comida que nos é servida em sacos de plástico. A ASAE não teria mãos a medir nas ruas de BKK.

O que eu não sabia é que aquele calor peganhento me faria gostar de andar à chuva, talvez porque aquela chuva refresca uma pele já húmida, e portanto não atrapalha. Pelo contrário, sabe bem, refresca. Meu deus, a chuva refresca e de que maneira. Aquela chuva não é igual à de Lisboa, que incomoda e nunca vem a calhar, despropositada e estúpida até de inverno. Pela primeira vez na vida gostei de andar à chuva, saltitando de barco em barco na travessia do Chao Phraya.

Também não me sabia curiosa ou corajosa o suficiente para posar a mão num tigre e acariciá-lo como se de um gatinho se tratasse. Um não, vários. E assim me deixei fotografar no Tiger Temple, santuário de animais protegidos pelos monges e que com eles convivem.

Descalcei-me à entrada de todo e qualquer templo budista, permiti-me ajoelhar e rezar juntamente com um monge que creio ter-me abençoado (creio, pois não percebi patavina do que me disse). Fiz os pedidos que a minha consciência ditou e ele ofereceu-me uma pulseira branca, do mais simples que há, mas carregadinha de simbolismo. Há-de decorar o meu pulso direito até se desintegrar. Deus não há-de chatear-se comigo por isso.

Percorri as ruas de Patpong com o mesmo embaraço e pena com que se percorre o Red Light District de Amesterdão, e com a mesma sensação de que aquelas raparigas podiam ser tanto mais... No entanto, parecem felizes na sua abordagem atrevida. A certa altura percebemos que o embaraço é maior do nosso lado do que do delas, e que não há lugar a pena num local onde o dinheiro é a palavra de ordem e a escolha é uma realidade. Há quem escolha fazer massagens de uma hora por qualquer coisa como 250 bahts (5.66€), há quem escolha lançar (de dentro das suas entranhas) bolas de ping pong aos que pagam 500 bahts para ver o freak show. Sem hipocrisias, tudo a olhos vistos, mas só lá vai quem quer!

No entanto, os tailandeses não se resumem a isto. A educação e a cortesia são recorrentes. Nada é feito sem um Obrigado (Khob khun kha) acompanhado do gesto de cumprimento tradicional, juntando aos mãos como quem está a rezar, e um humilde baixar de cabeça em sinal de respeito. Tão mais meigo que o nosso tradicional aperto de mão.

Tinha na ideia que a tribo Karen, conhecida pelas mulheres girafa ou Long Neck, seria o mais próximo possível de uma aberração, e até nisso me surpreendi. Receei tratar-se de uma espécie de jardim zoológico humano, onde as mulheres seriam expostas e exibidas contra a sua vontade. Felizmente dei o benefício da dúvida, fui e conheci mulheres de todas a idades, que desde os 5 anos acrescentam anéis ao pescoço para se embelezarem (o que outrora servia para proteger de ataques de tigres, serve hoje em dia como ritual de beleza). E vaidosas que elas são! Vaidosas, sorridentes, simpáticas, bonitas até. Para turista ver? Algumas talvez, mas há sorrisos que não se fingem...


Fiz oito voos em duas companhias aéreas, regateei budas e chapéus de palha no mercado flutuante do Canal Damnoen Saduak, tive direito a massagens de 1 hora por 5 euros, conheci a terra do ópio na zona do Triângulo Dourado, pus um pezinho no Laos, andei de elefante, de canoa, de Long Tail Boat, de lancha, assisti a uma competição de Muay Thay, estive em praias de sonho (aquelas que aparecem nos filmes "007 - o Homem da Pistola Dourada" ou "A Praia" ), fiz snorkeling na Chicken Island, fiz duas directas, dormi pouco, cheguei de rastos, cheguei feliz e realizada.

Parte daquilo que se vive em viagem não é assimilado no próprio momento, nem tão pouco quando se partilha com os amigos que ficaram (por mais fotos que mostremos ou relatos que façamos). É preciso voltar a casa, à nossa cama, ao nosso conforto, ao nosso prato favorito, aos cheiros a que estamos habituados, aos rostos que nos são familiares. É no relembrar aquilo que se viveu (e que nos é tão alheio) que se concretiza uma viagem.

Quando viajamos fazemos coisas fora do normal, desbravamos caminhos por onde não estamos habituados a vaguear, longe daquilo que somos e dos limites que conhecemos em nós próprios.
É por isso que gosto de viajar!
Thank you Love