segunda-feira, agosto 20, 2018

"Ai ele é um óptimo pai, dá tudo aos filhos!"

"Ele é um óptimo pai, dá tudo aos filhos!"

Não sei se é o vosso caso, mas volta e meia ouço esta expressão e tenho alguma (para não dizer muita) dificuldade em aceitá-la. 

Se por dar tudo o locutor se refere ao amor, à paciência, à atenção dada aos filhos e ao tempo que lhes dedicamos de corpo e alma, a expressão esta correctíssima. Mas grande parte das pessoas usa esta expressão referindo-se ao que os pais compram aos filhos! E isso meus caros amigos, tenham lá santa paciência,  não é ser bom pai ou mãe.

Neste texto entenda-se por Pai a figura da parentalidade, ambos pai e mãe.

O Bom Pai não é o que paga as despesas ou o que enche o filho de coisas. O bom Pai é o que cria memórias na memória do seu filho.  

O Bom Pai não é o que paga 500€ de colégio esperando que seja lá que ele ganhe educação.  É certo que uma boa escolaridade o prepara melhor para a vida profissional e para a sua independência financeira no futuro, mas a educação, os valores, os princípios, as memórias, as brincadeiras, o saber rir, em conjunto, é feito em casa, pelos pais. 

O Bom Pai, tão pouco é o que paga a empregados para entreter o seu filho, porque ele próprio não tem pachorra para o fazer. O Bom Pai leva o filho ao parque e desce no escorrega com ele. O Bom Pai é o que está desejoso de o levar à praia e fazer com ele piscinas na areia. É o que não se importa de se sujar para regozijo do seu filho. É o que larga o que está a fazer pois chegou a hora de lhe dar banho. É o que se senta no chão ao seu lado fazendo sons ridículos só para o ouvir a palrar. Sim, o Bom Pai não se importa de parecer ridículo.  É o que se coloca de gatas ensinando-o a gatinhar, é o que o incentiva a andar, correr e jogar à bola, é o que vai com ele andar de bicicleta e o leva ao futebol.

O Bom Pai é o que está presente nas vivências do seu filho e lhe proporciona experiências, não o que compra as suas ausências.

E isto independentemente de serem "pais a tempo inteiro" ou pais que têm dias específicos para estar com os filhos pelas circunstâncias de um divórcio. Os pais divorciados, apesar de não proporcionarem uma vida familiar comum aos seus filhos, podem, devem e conseguem tal como todos os pais se assim o entenderem e se esforçarem, acompanhar o seu filho de perto, vivendo ao seu lado experiências inolvidáveis no dia a dia, estando muitas vezes mais próximos das suas crianças nos dias em que estão com eles do que alguns "pais a tempo inteiro".

Não é por se estar todos os dias com eles que os fazemos felizes, principalmente se nós não formos felizes. A separação de um casal é uma decisão muito complicada, sendo que a parte mais dolorosa é saber que os nossos filhos não estarão connosco todos os dias das suas vidas, mas é exactamente por isso que é importantíssimo aproveitá-los ao máximo nos dias em que eles estão connosco. Antes uma boa separação do que um mau casamento. Antes eles terem duas famílias que os amam, do que assistirem diariamente a faltas de respeito graves e constantes entre os pais.

Das viagens aos concertos e teatros, dos passeios de fim de semana ao acompanhamento escolar, há tanto por fazer por um filho que pagar-lhe as despesas é só o mínimo e obrigatório. "Comprá-lo" com prendas, isso qualquer um faz, dependendo dos seus rendimentos. Não se é um excelente pai porque se ofereceu um carro topo de gama assim que o chavalo tira a carta. Isso é tão fácil. O dinheiro compra. 

O difícil é criar-lhes memórias, saber ouvi-los, ver com eles um filme juntos no sofá (mesmo que já sejam crescidos), saber de cor a letra da sua música preferida, e porque não, terem uma música em comum. 

O difícil é conhecer os seus gostos nas diversas fases do seu desenvolvimento: saber quem é o seu actor preferido, qual a cor que mais gostam de vestir, como gostam de ser acordados, o que os faz rir, o que os faz chorar, saber exactamente a prenda que gostariam de receber. 

O difícil é não escolher por eles o caminho que devem seguir e aprender que temos de os deixar caminhar pelo próprio pé. O Bom Pai não é o que insinua as suas escolhas como sendo as melhores para o filho, e lhe tolda o pensamento e condiciona as decisões enquanto diz "tu podes fazer o que quiseres, mas criei isto para ti ".  O Bom Pai é o que mostra oportunidades que permitem a liberdade de escolha. Abre portas, apresenta cenários e diz "tu podes ser o que quiseres. O céu é o limite!" Amar é saber deixar ir mesmo que estejamos a morrer de saudades.

O difícil é demonstrarmo-nos atentos e interessados em tudo o que fazem. Não lhes dar esse apoio, a isso chama-se abandono, mesmo que se esteja com os filhos todos os dias do ano.

Qualidade, e não quantidade! Até porque a parentalidade não é apenas um estado ou uma condição, é suposto ser uma escolha e uma vontade consciente. Há que ter filhos por gosto.

















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