Eu fiquei de falar nisto, quando anunciei que estava grávida, mas ainda não tinha conseguido reunir forças para o fazer.
Não é fácil partilhar a angústia de uma perda gestacional com quem nunca teve essa experiência, mas hoje recebi um convite para partilhar a minha perda com um grupo de mulheres que já passaram por isso. E isso fez-me sentido. Trata-se do grupo ESPERANÇA ARCO-ÍRIS.
Hoje, grávida de quase 19 semanas aos 42 anos, já consigo falar/escrever para quem passou pela terrível experiência de uma perda gestacional e dizer-lhes que a última coisa a morrer é a esperança.
Seja às 5, às 10 ou às 13 semanas de gravidez, custa muito saber que algo não está bem, que o bebé não está bem, que não será uma gravidez evolutiva e que estamos a abortar. No dia em que nos dizem isso parece que o mundo vai acabar e sentimos que estamos a perder não só uma parte de nós, mas também um projecto, um sonho, em desejo. Pelo menos, foi assim que o senti quando passei por isso em Junho deste ano.
"O que se passou? Porquê comigo? Será que fiz alguma coisa de errado? Se calhar não devia ter continuado a treinar, não devia ter participado naquela corrida, não devia ter feito aquele esforço..." Tentamos encontrar uma explicação quando muitas vezes não há explicação, ou se ela existe nunca iremos ter a certeza do que sucedeu.
- É porque não tinha de ser - diz-me o médico - por vezes, quando as coisas não estão bem, a natureza resolve da melhor maneira. E o melhor neste caso, foi a perda.
Dada a notícia, chorada a tragédia, é tempo de limpar as lágrimas e resolver. Já que não há nada que possamos fazer por aquele filho, há que tratar de nós e garantir que fica tudo bem com o nosso corpo. Quando nos lembramos do que acabou de nos acontecer, voltamos a chorar e a limpar as lágrimas, e esforçamo-nos para alimentar a alma com a esperança de uma nova tentativa no futuro.
Passado o pesadelo maior, os médicos finalmente deram-me carta branca para voltar a tentar, e em Setembro fiquei grávida novamente. Nessa altura, e com enorme receio que me voltasse a acontecer tudo novamente, parei de fazer a minha vida normal. Deixei de treinar, deixei de ser voluntária, deixei de correr, tentei não me stressar com nada nem com ninguém, durante os primeiros três meses.
Os médicos bem me diziam que não foi o treino ou algo que eu possa ter feito que justificou aquele aborto, mas eu não conseguia fazer nada que pudesse pôr em risco esta nova gravidez. Afinal tenho 42 anos e pouco tempo a perder. O relógio biológico está a chegar ao seu limite.
Passadas as primeiras 12/13 semanas voltei aos meus hábitos, aos meus treinos de step e até algumas caminhadas com corrida. Foi só nessa altura que partilhei com família e amigos que estava de esperanças.
Grande parte das mulheres espera pelo veredicto do médico para dar a notícia aos familiares e amigos, e nesse segredo, muitas são as que passam por uma perda gestacional praticamente sozinhas. Com um misto de tristeza e vergonha por não ter conseguido levar aquela gravidez até ao fim, opta-se pelo silêncio. Até porque não há nada que nos possam dizer que nos vá deixar melhor.
Ou pelo menos assim pensamos até ao momento em que nos apercebemos que não somos a excepção, e verificamos que milhares de mulheres já passaram pelo menos por uma experiência semelhante. Muitas delas voltaram a engravidar e tiveram filhos depois desse episódio. É mais recorrente do que imaginamos, apenas não se fala muito nisso. Não estamos sozinhas, não somos caso raro e na grande maioria não se passa nada de estranho connosco. É só ganhar coragem e tentar outra vez. A última coisa a morrer é a esperança.
O sentimento de perda está sempre lá, mas com a barriga a crescer cresce em mim a certeza que se calhar foi melhor assim. É porque não tinha de ser. O meu corpo rejeitou aquele ser e com toda a certeza o terá feito por um motivo forte. É porque algo não estava bem.
Continuo com receio de que algo possa não correr bem com esta nova gravidez. Ouvimos tantas histórias de gravidezes já avançadas que não chegam a bom porto que nunca estamos descansadas, nunca respiramos de alívio.
O nosso sossego só termina quando eles nascem. E daí talvez não. Quando eles nascem aparecem receios novos e nunca mais na vida temos descanso. Nunca mais! E ainda bem.
Um abraço forte e muita esperança a todas as mulheres que passaram pela angústia de uma perda gestacional. Lembrem-se que já somos umas valentes e super corajosas só por continuar a tentar.
Boa sorte!